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Informática no Ensino Médio
Projeto leva computação a escolas do Ensino Médio
Projeto leva computação a escolas do Ensino Médio
Graduandos da UFPB revelam os “mistérios” da informática a alunos que não dispõem de computador em casa
Márcia Dementshuk
O fato de não ter computadores ou acesso à Internet não impede o ensino da computação para estudantes do Ensino Básico do Vale do Mamanguape, no Litoral Norte da Paraíba. Entre virar as costas às dificuldades e encarar o desafio para levar novas perspectivas às crianças e jovens da região, graduandos da Licenciatura da Ciência da Computação da Universidade Federal da Paraíba, em Rio Tinto, escolhem usar a criatividade para ensinar como “pensa” um computador. E eles garantem: “o passo a passo para criação de um algoritmo pode ser adaptado para resolver problemas da vida”.
Antes do meio dia, nos corredores do campus IV da UFPB, os universitários Emanuel Éverton e Ivonaldo Duarte encontram com a professora Pasqueline Scaico, coordenadora do curso de Licenciatura da Ciência da Computação (LCC) e avisam que estão arrumando a sala Multiuso para a apresentação. Estava marcada para 13 horas uma demonstração dos grupos de Extensão e de bolsistas do Programa de Iniciação à Docência – cerca de 10 projetos. Emanuel e Ivonaldo antecipam a programação:
“Cada estudante escolheu um jeito para ensinar o pensamento computacional para alunos das escolas. Uns usam a robótica, outros usam games; temos a Eagle, empresa Júnior; o Ethical Hackers, em segurança; e tem aqueles que resolveram ensinar mesmo que não haja um equipamento eletrônico na escola. É a computação desplugada. Nós, por exemplo, montamos um jogo de tabuleiro que, sem perceber, no final, o jogador construiu um algoritmo! O mais interessante é que eles aprendem um raciocínio que vai ajudá-los nas tarefas cotidianas, nos estudos, em qualquer carreira que eles queiram seguir”.
Pasqueline Scaico esclarece que o pensamento computacional é a base para a formulação de um problema e a construção dos caminhos para sua solução. “Detalhe: usando, ou não, a tecnologia. Em muitas escolas não contamos com um laboratório de informática, de conectividade. Mesmo assim, os conceitos de computação dão o poder aos alunos de resolverem problemas usando competências cognitivas – o raciocínio lógico.”
Estudantes ampliam perspectiva com a computação
Como o currículo do Ensino Básico não inclui a obrigatoriedade do ensino da computação, outro esforço dos alunos e professores da LCC é convencer os gestores escolares dos benefícios em aprender os conceitos da computação. É um trabalho de “bits” e meio a “terabytes” de resistência.
Os graduandos da LCC precisam fazer 405 horas de estágio supervisionado obrigatório em escolas. Diante da realidade da ausência dessa disciplina nas escolas, os professores da universidade estimulam os alunos a buscarem as oportunidades nas escolas e abrirem as portas.
“Quando começamos a aplicar os projetos, a postura na escola muda. As crianças e adolescentes amam e os professores veem os resultados”, garantem Andreza Lira e Elísio Barreto, que aplicam robótica para ensinar potenciação, expressões numéricas, equações de primeiro grau!
A atividade está transformando o pensamento nas salas de aulas das escolas e das comunidades do Vale do Mamanguape. “É impactante quando chegamos em uma escola onde vemos as meninas de 14 ou 15 anos grávidas… Adolescente sem saber ou perceber que há oportunidades para sair de um ciclo que os deixa sempre onde estão, no subdesenvolvimento. Trazemos muitos para o campus, um lugar perto de onde eles moram, e mostramos que aquilo foi construído para eles. Quando conseguem entrar aqui, mudam o curso da família inteira”, desabafa a professora Pasqueline Scaico.
Física sem raiva, com game
Quando o personagem do jogo Angry Birds se lança do estilingue e voa, o professor Otni Rodrigues, da Escola Cidadã Integral Técnica João da Matta Cavalcanti de Albuquerque, em Mamanguape, dá uma pausa. É hora de calcular a aceleração de “Red”, o líder dos pássaros.
O professor Otni Rodrigues se formou em Licenciatura da Ciência da Computação e agora ensina Física através dos games. “Falou em jogo digital, a motivação sobe muito; parece que a cabeça se abre pra aprender”, certifica Otni.
Outro egresso de LCC na ECIT em Mamanguape é Rivanildo Santos que, de espectador passou a ser protagonista na educação. “Na ECIT a gente acolhe esse ser, que é o estudante, e tem um projeto de vida e o apoia”, diz Rivanildo, sabendo exatamente como o estudante se sente. “Eu pude aprender na universidade e agora passo para os estudantes toda a minha experiência”.
Hoje ele é preceptor dos estagiários da Licenciatura na ECIT: “Os estudantes universitários podem atuar dentro das minhas aulas aqui na escola; eles fazem cursos, palestras, formação de outros professores da escola… É um espaço para desenvolverem as competências do curso.”
Em busca do equilíbrio das forças
O curso de Licenciatura em Ciência da Computação tem a frequência de cerca de 300 estudantes. Mas a participação das mulheres não soma 40 meninas. A média segue uma tendência nacional em cursos de Ciências Exatas. Tanara Lauschner, membro da diretoria do programa Meninas Digitais, da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), aponta dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): “O percentual de mulheres ingressantes em cursos da área de tecnologia, em 2016, foi em torno de 10 a 12% e a maior parte delas abandonam o curso no meio”.
O desequilíbrio afeta o desempenho das meninas na universidade, que se intimidam diante da maioria masculina. Por isso, no final de 2015, as meninas da LCC organizaram um encontro, porque se viram em pouco número e dispersas no curso. Chamaram as professoras; entre elas, a professora Vanessa Dantas, que apoiou o projeto “IT Girls, o qual começou, oficialmente, em 2016.
“O bom é que aqui, temos o corpo docente bem equilibrado, com mulheres em disciplinas chaves da computação. Mas no campus, víamos que as meninas sofriam assédio, intimidações. Inclusive, quando conseguimos a primeira bolsa para o projeto, destinada só para meninas, os meninos questionaram muito. A resistência foi muito grande. Agora vemos o quanto isso mudou: temos meninos participando do projeto”, explica a professora Vanessa.